Devido aos preços altos do café, Illy vai apertar margens e reduzir custos

Com a alta consistente do café no mundo, a italiana illycaffè vai segurar a margem de lucro e reduzir os custos operacionais para enfrentar a crise de preços, que gerou muita especulação, segundo o presidente da empresa, Andrea Illy, que está no Brasil esta semana. Contudo, ele prevê uma provável queda da commodity nos próximos 18 meses, pois acredita na renovação das lavouras nos países produtores, em especial Brasil e Vietnã.

“Esse ano, vamos comprimir a lucratividade para voltar a crescer em 2026. Esse é um choque financeiro que estamos absorvendo, pois temos capacidade financeira”, falou à reportagem.

Andrea Illy acrescentou que a empresa vai dobrar a capacidade produtiva e lançar novos produtos, como uma cápsula de material reciclável. Segundo o italiano, será uma forma de compensar o aumento dos custos de produção.

Ele reforçou que o aumento de preços desde 2024 é reflexo de uma crise climática, e que, apesar de o mercado global do café já ter vivido altas que elevaram os preços a US$ 3,00 por libra-peso, desta vez houve muita especulação. Ainda assim, ele enxerga que, como na história do mercado de café desde a década de 1970, a próxima safra é de recuperação.

O presidente da companhia acredita, assim como a projeção divulgada pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a perda de café será limitada, o que diverge da posição de analistas de mercado, que dizem esperar perdas mais “agressivas” na safra brasileira.

Para o ciclo 2026/27, ele tem uma perspectiva de recuperação em volume e qualidade de café no Brasil. Contudo, isso não significa que os resultados do ciclo atual (2025/26) sejam ruins. Andrea Illy aposta que a queda de produção não será grande. “

O preço de US$ 4,00 não é indicativo de desequilíbrio da demanda e oferta. Isso é uma gigante bola especulativa que foi favorecida pela seca dupla no parque cafeeiro do Vietnã e Brasil”, avaliou. “A forte onda de especulação começou ano passado com o cacau e serviu de combustível para o mercado continuar especulando outras commodities, como suco de laranja e café.”

Ele preferiu não ser categórico, mas indicou que o pico de preço do café já passou e que agora é um momento de filtrar os posicionamentos do mercado que negocia nas bolsas. “Ano que vem vai ser muito mais favorável, sem El Niño e com condições climáticas muito mais favoráveis para produção de café máxima possível. Além disso, desde o ano passado, a produção de mudas aumentou cerca de 50%”, o que, para ele, sinaliza um cenário positivo para a cafeicultura, em especial para o Brasil.

Andrea Illy lembrou também que, mesmo com os problemas de seca, o valor repassado de prêmio do café não mudou, de US$ 2 para US$ 4 por sacas. Mas isso não significa que a margem do produtor não siga pressionada.

Geopolítica

Illy disse que a China se tornou um dos principais clientes no mercado de café mundial e a companhia italiana está marcando presença no país asiático. Ele citou que, além do interesse de compra de grãos verdes, a China está iniciando uma produção local com marcas de café chinesas muito competitivas, o que deve mudar a cena mundial.

“Nós continuamos a apresentar um segmento de altíssima qualidade com uma base de clientes selecionados e, por consequência, vamos continuar a desenvolver nossos negócios na China, o problema é a geopolítica”, indicou.

O executivo italiano disse que a “nova ordem geopolítica mundial” atrapalha o comércio internacional e as exportações com as incertezas e a falta de clareza sobre como desenvolver as negociações diante de guerras tarifárias. Para Andrea Illy, as tarifas comerciais impostas pelo governo americano, e a iminência da lei antidesmate da União Europeia, a EUDR, seguirão pressionando a cadeia.

“Tudo isso marca a instabilidade do mercado com altas crescentes, pressionando a cadeia produtiva”, destacou o presidente. Vamos ver os impactos verdadeiros das tarifas e da EUDR e, com isso, pode ser que a médio prazo as condições [de mercado] se normalizem”, afirmou.

Inteligência artificial

Illy confirmou que estará na COP 30, em novembro em Belém (PA), onde deve apresentar uma proposta de utilização de inteligência artificial para a cafeicultura mundial. A intenção é adotar a ferramenta para capturar dados de lavoura, de meteorologia, além de possibilitar um diagnóstico de recursos naturais imprescindíveis para o plantio do grão, como água e energia.

“Vou tentar desenvolver um caso que ajude a caracterizar, simular e prever a evolução do clima, também de como as estratégias de adaptação, como a agricultura regenerativa e a renovação das lavouras podem ajudar a cadeia. Mas, para mostrar isso, é necessário um protótipo que precisa de dados históricos meteorológicos, de produção e de histórico agronômico do Brasil, além de preços de mercado para identificar correlações”, detalhou.

Andrea Illy vai utilizar as informações das lavouras brasileiras para estruturar a proposta. Ele diz acreditar que a ferramenta é ideal para relacionar desenvolvimento social e ambiental na cafeicultura.

“Por exemplo, a IA pode verificar, prever e mensurar o impacto do El Niño sobre a cafeicultura, para prever quais ações corretivas a se fazer nas lavouras e como trabalhar com os preços. A illy acredita muito nessa tecnologia para poder estruturar um modelo sistêmico”, acrescentou.

O presidente da companhia lembra que esse projeto começaria com o Brasil. Se funcionar, poderia ir para outros países. Para desenvolver esse protótipo de estudo de caso na COP, o italiano contou que a Illycaffè se tornou parceira em um projeto de inovação, promovido pela companhia de segurança geral da Itália junto com o Google. O objetivo é tornar acessível a coleta e o fornecimento de dados da agricultura.

O projeto incluiu outros parceiros, entre eles instituições italianas e até o banco Goldman Sachs. Conta também com a agência de fomento industrial da ONU.

Para ele, que está em São Paulo para a tradicional premiação da empresa dos melhores cafés do Brasil, o mais importante neste momento é de atenuar crises climáticas nas lavouras de café, com melhora de manejo agrícola, além de renovar parques cafeeiros.

Fonte: Revista Globo Rural