Sul de Minas: Tecnologia e ‘mudança de visão’ alavancam produção de café na última década

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“O café sempre esteve presente na mesa nossa. Mas, hoje, o consumidor tem mais informações sobre o que está consumindo e há um mercado crescente com cafés com certificação, rastreados, com produtividade de acordo com leis ambientais”.

A frase do presidente do Centro de Comércio de Café do Estado de Minas Gerais, Archimedes Coli Neto, se encaixa para a alteração na maneira de produção e também na mudança de patamar do café brasileiro, que tem Minas Gerais como maior produtor e é cada vez mais comum na mesa de qualquer família.

Ela se encaixa ainda para as produções de vinho e morango na região, que evoluíram na última década e ganharam ainda mais espaço no mercado.

O g1 EPTV completa 10 anos no Sul de Minas nesta quinta-feira (10) e o g1 Sul de Minas mostra esta evolução nesta reportagem especial. A tecnologia é considerada por especialistas e pelos próprios produtores como a principal responsável para a mudança de patamar, pois trouxe novas maneiras de plantio e fez aumentar a quantidade do produto final.

Café, o carro-chefe

Campos Gerais, Três Pontas, Boa Esperança, Machado, São Sebastião do Paraíso, Nepomuceno, Ibiraci, Nova Resende, Carmo da Cachoeira, Alfenas, Campestre e Carmo do Rio Claro, além e Varginha, são as cidades que mais produzem café no Sul de Minas, conforme a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater–MG).

Novos produtores têm surgido ano a ano, assim como a quantidade de café produzido cresce anualmente. Segundo balanço da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a região Sul de Minas, junto com a Centro-Oeste do estado, saltou de 1.554.246 pés de café em produção, para 1.582.540 entre 2012 e 2022.

Café produzido no Sul de Minas ganha destaque pelo mundo; foto da plantação em Varginha (MG) — Foto: Gabriel Moura

Levantamento da Conab divulgado este mês, destaca que a produção esperada para o Brasil, em 2022, é de 55,7 milhões de sacas de 60 quilos. A estimativa, caso confirmada, representa um acréscimo de 16,8% em comparação à 2021.

O crescimento da produção tem como um dos principais fatores a tecnologia, conforme o presidente da CCCMG, Archimedes Coli Neto.

“Surgiram novos cultivares, mais produtividade. Cultivares resistentes a várias doenças. A produtividade no Brasil mudou bastante, até hoje estamos por volta de 32, 33 sacas em média por hectare. Houve uma revolução muito grande no setor produtivo: novas ocupações, solo, novos produtos. Isso fez com que a cafeicultura melhorasse muito a produtividade, com mais acompanhamento de agrônomos, mais profissionais dando assistência no campo”.

“O achismo que existia no campo, já não acontece mais. Temos muitos profissionais com novas podas, novas técnicas. Isso fez com que tudo melhorasse muito. Melhorou a tecnologia, a parte de colheita com máquinas no campo. Tudo isso fez com que o campo desse uma resposta muito boa em termos de produção e qualidade”.

Café produzido em Varginha (MG) — Foto: Gabriel Moura

De acordo com Archimedes, em uma safra normal, o Brasil tem produzido por volta de 60 e 65 milhões de sacas entre os tipos arábica e conilon. Grande parte dessa produção vem do Sul de Minas, sendo que os maiores compradores, além de todas as partes do país, vêm da Europa e dos Estados Unidos, além do Japão.

O café do Sul de MG também é destaque na modalidade de cafés especiais. Essa especificidade é resultado de uma rede que deve seguir padrões de qualidade, rastreabilidade e sociais.

Estes produtores estão localizados em áreas conhecidas da região denominadas como ‘Mantiqueira de Minas’ e ‘Sul de Minas’, sendo que estes cafés, considerados especiais, estão presentes no marcado interno e também no mercado externo. Tudo isso, devido a uma “visão de mercado” dos produtores, segundo o presidente da CCCMG.

Cafés especiais caíram no gosto dos consumidores nacionais e internacionais — Foto: Divulgação: Cocatrel

“Na parte de comercialização surgiram novas oportunidades para os cafés especiais, cafés regionais, certificações. A parte de comercialização mudou muito. O produtor começou a aproveitar mais o mercado, havendo uma evolução muito grande. O Brasil ganhou muito mercado para cafés especiais. Acredito que isso veio valorizar muito a produção. Há muitos produtores mais bem informados com relação ao mercado interno e externo. Tudo isso foi muito bom, aliada à internet no campo, que fez o produtor acompanhar mais as notícias”, disse Archimedes.

Fernando Batista Pereira, que é economista da Universidade Federal de Alfenas (Unifal), destacou o aumento da presença do café especial brasileiro tanto no mercado interno quanto no externo. Segundo ele, essa mudança é notada entre os últimos 5 e 10 anos.

“No caso especial do café, que é o nosso grande produto agrícola, ele vem passando nos últimos anos para produto mais qualificado, um produto de maior qualidade, que é esse café de maior qualidade, o café gourmet. Esse produto, embora o Brasil tivesse uma parcela muito pequena desse café no mundo, em geral isso acaba sendo disputado pela Colômbia e Etiópia. O Brasil, nos últimos 5 a 10 anos, passou a disputar, a ter uma produção considerável desse tipo de café, inclusive no mercado nacional”.

“No mercado nacional, até 10 anos atrás, a gente estava acostumado só com aquele café de pior qualidade, o café básico. Desses 5 a 10 anos para cá tivemos uma demanda mais qualificada do mercado seja nacional ou internacional e os produtores pelo visto estão aproveitando. A gente não sabe até quando isso vai ser possível, mas ao que parece tem uma margem considerável para essa mudança continuar ocorrendo”, explicou o economista.

A mudança de paladar, o interesse de jovens e a internet são outras mudanças notadas nos últimos anos que têm refletido no consumo de café, de acordo com o presidente da CCCMG. Archimedes Coli Neto também destacou as cafeterias como um pronto de encontro que reflete na busca por cafés de melhor qualidade.

“O Brasil é um dos grandes consumidores de café. O que a gente nota é que os jovens estão tomando mais café, as cafeterias vieram revolucionar isso como um ponto de encontro. As pessoas estão apreciando os cafés de melhor forma, conhecendo o café e aprendendo a tomar o café de qualidade superior. Isso veio acontecendo nos últimos anos. Melhorou muito o consumo interno”.

“Não vejo o café como algo de luxo, mas noto um gosto mais refinado para os cafés finos, com as cafeterias sendo um ponto de encontro. Hoje o consumidor tem mais informações sobre o que está consumindo e há um mercado crescente, cafés com certificação, rastreados, com produtividade de acordo com leis ambientais”, comentou.

Produção de café em Varginha (MG) — Foto: Gabriel Moura

O transporte do café também passou por mudanças nos últimos anos e atualmente é feito à granel, em caminhões bitrem e em containers. Esta parte logística tem um projeto futuro para melhorar ainda mais a maneira de levar o produto para os portos de exportação e também para distribuição no mercado interno.

Esse é um projeto do Porto Seco Sul de Minas. A empresa, localizada em Varginha, presta serviços de armazenagem e movimentações de cargas. Atualmente, ela faz o transporte do café por caminhões até o Porto de Santos, mas possui um projeto em andamento para fazer a locomoção da cidade até o Porto de Angra dos Reis por trem.

A mudança pode fazer com que de dois containers por viagem que um caminhão faz atualmente se transformem em até 160 de uma vez por trem.

“Cada bitrem [caminhão] carrega no máximo dois containers carregados. No trem, a gente consegue colocar até dois containers de até 20 pés por vagão ou um de 40 pés. Essas são composições de até 80 vagões, ou seja poderíamos levar até 160 containers”, explicou Otávio Paravizo Bregalda, do setor de Qualidade e Inovação do Porto Seco.

O início das operações depende da reforma da linha férrea. A VLI, empresa que controla as concessionárias de transporte ferroviário de cargas Ferrovia Centro-Atlântica S.A, tinha o plano de devolver o trecho para o governo federal. No entanto, após a apresentação de estudos, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) deu prazo de 30 meses para que a reforma seja feita.

Atualmente, após o acordo, restam 23 meses para que a manutenção seja feita, o que traz a perspectiva de ainda mais o nacional e internacional do café do Sul de Minas para os próximos anos.

Fonte: g1 Sul de Minas (Por Franco Junior)