ARTIGO: Muito “blá blá blá…”

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Por Marcelo Fraga Moreira*

A semana começou com o mercado procurando notícias “novas” em busca de direção. Infelizmente só tivemos “notícias / desculpas / argumentos velhos/requentados”, tais como:

– no período o R$ “desvalorizou” dando suporte aos preços!

Sério? O R$ desvalorizou -1,29% e o vencimento Set-22 valorizou +1,77% – ou seja, ficou “elas por elas”;

– OIC*:  Publicou novamente que “o mercado global de café registrará um déficit de 3,1 milhões de sacas na temporada 2021/22 (outubro-setembro), já que o Brasil, maior produtor, colhe uma safra menor e ‘fora de temporada’.

Alertou, no entanto, que o equilíbrio do mercado pode mudar acentuadamente devido a uma potencial desaceleração da economia mundial, aumento dos custos de produção e redução do consumo e das importações devido ao conflito Rússia-Ucrânia.

A OIC estimou a produção global de café em 2021/22 em 167,2 milhões de sacas de 60 kg, uma queda de 2,1% em relação ao ano anterior, e o consumo em 170,3 milhões de sacas, um aumento anual de 3,3%”.

A informação acima já circulou no mercado umas 10x nos últimos 2-3 meses!

Novamente tentam convencer o mercado que “o Brasil continua enfrentando problemas com a disponibilidade de contêineres, embora tenham melhorado nas últimas semanas, disse a ICO“.

Onde estão os “problemas logísticos” com o Brasil exportando, na média mensal dos últimos 9 meses, uma quantidade acima dos +3.300.000 sacas/mês?

Na safra 20/21 o Brasil, com uma produção estimada em +70,0 milhões de sacas, exportou na média mensal entre julho-21/junho-22, +3.806,000 sacas.

– IBGE*:

Na quinta-feira o IBGE* voltou a publicar nova estimativa para a safra 22/23 estimada agora em +56,1 milhões de sacas de 60 kg – um aumento “significativo” em +de 0,9% – aproximadamente +550.000 sacas (esse volume representa apenas +4,7 dias da exportação anual brasileira. Ou seja, “nada”!

– Abic* publicou nova estimativa para o consumo interno brasileiro, durante o período nov-20/out-21, em +21.500.000 sacas.

O consumo interno brasileiro segue sendo uma incógnita. Esse número tem variado entre +21,0 / +22,5 milhões de sacas.

Coincidentemente, no mesmo dia, a Hedgepoint publicou sua nova projeção para o consumo interno, também em +21,50 milhões de sacas:

Estimamos que a demanda brasileira pode cair em 21/22, para 21,5 milhões de sacas (-4% a/a) devido a uma desaceleração econômica aliada ao aumento dos preços para o consumidor final.

A demanda por café se correlaciona positivamente com o salário mínimo deflacionado no Brasil – que registrou queda, devido ao aumento da inflação. Também mantém uma relação positiva com o PIB do ano anterior – que caiu, diante da pandemia. A demanda cai quando os preços aumentam – embora essa relação seja mais tênue. No entanto, quando esses três elementos são combinados, o efeito geral sobre a demanda é negativo“.

Ora, os preços no mercado interno começaram a subir justamente após esse período (nov-20/out-21), com aumentos superiores a +60% nas gondolas dos supermercados. Com a volta da inflação, aumento dos combustíveis, dos alimentos em geral, será que o consumo interno vai aumentar no período nov-21/out-22? E para o período nov-22/out-23? Façam suas apostas!

A semana começou com o Set-22 fechando em alta de +245 pontos @ 230,20 centavos de dólar por libra-peso. Na terça-feira fechou com leve alta de +65 pontos; na quarta-feira e quinta-feira fechou novamente em baixa de -260 e -125 pontos respectivamente e finalmente, na sexta-feira o mercado voltou às compras com o Set-22 fechando com +620 pontos @ 231.05 centavos de dólar por libra-peso. O volume negociado na sexta-feira, com o mercado chegando a variar +815 pontos entre a mínima e a máxima do dia (+224,25  +232,40 centavos de dólar por libra-peso), chegou a +78.207 lotes!

Os fundos+especuladores “comprados” conseguiram defender suas posições. Na semana o Set-22 trabalhou respeitando o suporte das médias móveis dos 9 e 17 dias e tendo como resistência as médias móveis dos 50 e 100 dias.

O elevado volume diário negociado na quarta/quinta/sexta-feira, respectivamente +61.744 / +62.533 / +78.207 lotes por dia, deve estar vindo dos fundos+especuladores pois o produtor brasileiro praticamente já vendeu toda sua safra 21/22 e não tem mais “bala na agulha” para pressionar o mercado spot com suas vendas contra o vencimento Maio-22, Julho-22 e Set-22.

A justificativa para o aumento dos preços/volume negociado nas principais commodities na sexta-feira foi a volta da inflação com os fundos procurando “proteção” nas commodities.

O mercado interno segue com poucos negócios. Produtores seguem vendendo “da mão pra boca” e preços continuaram oscilando entre +R$ 1.200 – R$ 1.350 /saca.

Interessante notar que os vencimentos Maio/Julho/Set-22 fecharam praticamente no mesmo nível (+231,65 / +231,55 / +231,05 centavos de dólar por libra-peso).

A grande notícia da semana veio referente ao atraso do inicio da colheita do café tipo robusta no Estado do Espirito Santo. Normalmente a safra na região começa na segunda quinzena de abril. A expectativa agora é começar “forte” apenas na primeira / segunda quinzena de maio! Aparentemente os grãos continuam verdes e produtores estão com problemas para encontrar mão-de-obra suficiente para dar início aos trabalhos.

Os produtores também seguem contestando qualquer número/estimativa da safra 22/23 acima dos +55 milhões de sacas.

O engenheiro agrônomo Sr. José Carlos Gava Ferrão (conhecido no meio dos produtores como “Ferrão”, após percorrer mais de 8.000 km e visitando 300 produtores publicou na quarta-feira seu último levantamento para a safra do café robusta, na média em +13.527.000 sacas.

Segue abaixo a integra do levantamento da safra do café robusta realizada pelo Sr. Ferrão:

Safra Conilon 22/23 Brasil                    

■           Previsão:         Média = 13.527.000 sc

■   ( “análise técnica” )

 ■ 2° Levantamento concluído em 12/3/2022

  • Por Ferrão – Agri+
  • Eng° Agrônomo Sênior •Consultor e Produtor de café
  • Tel. ( 73 ) 9 9990-2201
  • email: [email protected]

■■■   Meus Números

■ Metodologia empregada:

  • Área em produção x Produtividade média x fatores bióticos e abióticos = expectativas reais.
  • Estas “expectativas” foram reforçadas pelas ações e informações abaixo:

▪visitas “in loco”

▪ informações de produtores/Agrônomos/Técnicos regionais, Compradores de café, armazéns

▪dados estatísticos ▪Levantamentos Sincal “in loco” em épocas diferentes, acompanhas por produtores, Agrônomos e  especialistas internacionais de renome e isentos – onde mostram a verdade “crua e nua”.

▪Mais de 8.000 km rodados e 300 produtores visitados ao longo do tempo com canais abertos de comunicação constante

▪ Canais de comunicação com mais de 6.000 produtores nos informando a real situação das lavouras.

■ Parque cafeeiro Conilon e seus “FUNDAMENTOS”:

 

1- ES –  245.000 ha em produção.

  • Produtividade média estimada entre 38 a 42 sc/ha.
  • Expectativa entre 9.310.000 a 10.535.000 sc

2- BA – 40.000 ha . ●Produtividade média entre 45 a 52 sc/ha

  • Expectativa entre 1.800.000 a 2.080.000 sc

3- RO – 69.000 ha. ●Produtividade média entre 18 a 23 sc/ha

  • Expectativa entre 1.242.000 a 1.587.000 sc
  • Uma das fontes que opinaram em RO foi o Sr. José Jordan (grande produtor e Vice-Governador, que fez o seguinte comentário – “mas não passa de 1.200.000 sc”)

4- Outros Estados

  • Entre 200.000 a 300.000 sc

■ TOTAL CONILON BRASIL

  • Somas de ES + BA + RO + OUTROS:

MÍNIMO= 12.552.000 sc MÁXIMO=14.502.000sc

■ PONTOS NEGATIVOS até o momento:

  • Forte abortamento em muitas lavouras por temperaturas baixas na pré-florada, durante a floração e pós-florada. Vários consultores como o Sebastião Silveira, Rogério Chiabai e outros atestaram em estudos próprios este grande problema. Em Algumas regiões o estresse foi provocado por variações repentinas entre baixas e altas temperaturas. Contribuiu também a nutrição desequilibrada e aquém das necessidades exigidas pela cultura.
  • Antracnose também tem sido um problema;
  • A alta exorbitante dos insumos x instabilidade de preços e insuficiência de margens pleiteada tem deixado o produtor inseguro e desestimulado a investir;
  • A “cochonilha da roseta” tem aparecido em muitos plantios e derrubado frutos de forma moderada no geral;
  • Infestação de broca tem sido outro problema que preocupa;
  • Entre junho a setembro tivemos forte déficit hídrico nos 3 estados produtores em significativas regiões produtoras;
  • Temos no parque cafeeiro conilon brasileiro uma alta % de lavouras sem irrigação e também uma alta percentagem que manejam a água de forma empírica, ou seja, “molham”, com consequências negativas;
  • Os produtores de melhores tecnologias fazem a PPC (poda programada de ciclo ) de 4 x 4 anos. Significa que 25% das lavouras que usam essa técnica tem uma produção entre 70 a 80% menor no ano subsequente (5° colheita) que precisam entrar nas estatísticas;
  • Problema seríssimo de falta de mão-de-obra que tem atrasado as operações do pacote tecnológico e impactado no resultado final da lavoura. Pra colheita tudo indica que teremos uma “inflação” nos custos de colheita e falta de mão-de-obra, o que pode resultar em perdas de café no pé/chão;
  • Temos vivenciado em alguns plantios “alta incidência de mortes de plantas”, provocada por “uma nova doença”, que tem diminuído o “stand” e comprometido a produtividade.

■ PONTOS POSITIVOS até o momento:

  • Clima no ES e BA melhorou nos meses de outubro e se mantém no geral favorável. Temos tido boas chuvas até agora neste início de março, o que pode refletir numa melhor granação e rendimento no secador dos grãos que “sobraram” no pé de café“.

A estimativa para a produção do café robusta, para a safra brasileira 22/23, está estimada entre +12.550.000 (estimativa “mínima” do Sr. Ferrão) / + 23.400.000 sacas (estimativa da Volcafé). Ou seja, estamos falando numa diferença de +10.850.000 sacas apenas para o café robusta!

A Cecafé* deverá publicar o fechamento do mês de março-22 na próxima segunda-feira. Expectativa gira ao redor dos +3.500.000 sacas. Infelizmente não atualizaram no site os números até o dia 08/04. Segunda a Cecafé* até o dia 05/04 o Brasil exportou apenas +36.072 sacas e solicitação para emissão de embarques estava em +217.893 sacas (quantidade -50,8% contra mesmo período do mês anterior).

Uma hora o café disponível brasileiro vai acabar! Com base no nosso quadro “oferta x demanda” (publicado em comentários anteriores) o Brasil deverá terminar o ano safra 21/22 com aproximadamente +17,0 milhões de sacas (nossa estimativa do estoque de passagem da safra 20/21 para a safra 21/22 está em +27,3 milhões de sacas)!

Nas próximas semanas vamos continuar escutando muito “blá blá blá” até o início efetivo da colheita e até a chegada/passagem do inverno.

No Set-22 próximas resistências @ +232/+240/+254 centavos de dólar por libra-peso e suportes @ +231/225/213 centavos de dólar por libra-peso.

Produtores façam suas contas! Protejam-se para as safras 23/24 e 24/25 analisando a curva do dólar e as cotações em NY para os vencimentos Set-23 e Set-24.

Tomem cuidado com as operações alavancadas, acumuladores, operações estruturadas que “aparecem/desaparecem/dobram” e com as “travas” sem hedge para as safras 23/24 em diante!

Ótima semana a todos!

*Marcelo Fraga Moreira é um profissional há mais de 30 anos atuando no mercado de commodities agrícolas, escreve este relatório sobre café semanalmente como colaborador da Archer Consulting.

** “Call” = opção de Compra
** “Put” = opção de Venda
** “Compra Call-Spread” = compra e venda simultânea de 2 Opções de Compra comprando a Opção com preço de exercício  mais baixo vendendo a Opção com preço de exercício mais alto);
** “Venda Call-Spread” = venda e compra simultânea 2 Opções de Compra vendendo a Opção com preço de exercício  mais baixa e comprando a Opção com preço de exercício mais alto);
** “Compra Put-Spread” = compra e venda simultânea 2 Opções de Venda comprando a Opção com preço de exercício  mais alto e vendendo a Opção com preço de exercício mais baixo);
** “Venda Put-Spread” = venda e compra simultânea 2 Opções de Venda vendendo a Opção com preço de exercício  mais alto e comprando a Opção com preço de exercício mais baixo);
** “CFTC” = Commodity Futures Trading Commission – agência independente do governo dos Estados Unidos que regula os mercados de futuros e opções das commodities;
** “IBGE” = Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
** “Cecafé” = Conselho dos Exportadores de Café do Brasil
** “USDA” = Departamento da Agricultura dos Estados Unidos
** “OIC” = Organização Internacional do Café
** “ABIC” = Associação Brasileira da Indústria de Café
** “Sincal” = Associação dos Produtores do Brasil
** “Pib” = Produto Interno Bruto
** “FED” = Banco Central Americano

Fonte: Archer Consulting – Assessoria em Mercados de Futuros, Opções e Derivativos Ltda