Teste Folha avalia os 10 cafés mais vendidos em supermercados de São Paulo

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O cafezinho nosso de cada dia é de baixa qualidade e de amargor acentuado. Foi essa a conclusão unânime a que três especialistas chegaram depois de provar às cegas as dez marcas de cafés mais vendidas em três supermercados de São Paulo, a convite da Folha.

Os rótulos foram pinçados a partir do ranking fornecido pelo Pão de Açúcar, pela Casa Santa Luzia e pelo Empório Santa Maria – não há um levantamento oficial. São eles: Origem Brasil, Santo Grão, Café do Ponto (foi provado o Cafeterie), Bravo, Floresta, Pilão, Mellita, Pelé, 3 Corações e Caboclo.

Para o júri, formado por Silvia Magalhães, gerente da Italian Coffee, Caio Alonso Fontes, editor da revista "Espresso", e Gelma Franco, diretora da Associação Brasileira de Café e Barista, os cafés mais bem avaliados exibiram notas cítricas e frutadas, doçura, corpo, frescor.

É o caso do Origem Brasil, que teve a nota mais alta (7,8 pontos). Nele, foram identificadas notas achocolatadas e "acidez prazerosa". O amargor, por outro lado, apareceu, com persistência -sempre identificado por todos os especialistas-, nas marcas mais mal avaliadas. Servem de exemplo o Caboclo, último colocado (com 3 pontos), o 3 Corações e o Pelé, que vieram em seguida, com 3,8 pontos.

Mas por que, então, o brasileiro ainda compra café amargo, mesmo com o crescimento da oferta de opções gourmets nas gôndolas de supermercado?

De acordo com a última pesquisa da Abic (Associação Brasileira da Indústria do Café), feita em parceria com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o fator determinante na compra de um rótulo é a marca a que o consumidor está habituado.

Isso ajuda a explicar a resistência à chegada de cafés gourmet, de melhor qualidade. Neste caso, outro fator é o preço: os cafés gourmet podem ser até quatro vezes mais caros que os tradicionais.

No entanto, a mesma pesquisa, realizada para identificar as tendências do consumo de café e o perfil do mercado de consumidores no Brasil, também demonstra que há um aumento de pessoas dispostas a pagar mais por um produto melhor -45% dos consumidores, em 2010, contra 34% em 2008.

"Nossa referência é o café ruim", diz Gelma Franco. Caio Fontes explica que a torra extraforte "mata todos os aspectos positivos do café, como sabor, aroma e acidez…".

Para ele, o consumidor deve "aproveitar a oportunidade de fazer do hábito de tomar café um momento mais prazeroso", sem ficar preso aos hábitos tradicionais.

"A escolha do café é ditada pela educação, pelos hábitos e pelo estilo. É como a escolha de um vestido ou de um terno", diz Kenneth James em "Escoffier – O Rei dos Chefs" (ed. Senac), a biografia do chef Auguste Escoffier (1846-1935), um dos mais importantes cozinheiros da França.

Para auxiliar o consumidor a arriscar mais na hora da compra e procurar alternativas mais bem avaliadas, experts dão dicas do que fazer diante de uma gôndola de supermercado, abarrotada de embalagens de café.

É DE AMARGAR!

O bom café não deve ter amargor, cravam os especialistas. No entanto, foi essa a característica identificada com mais regularidade pelos jurados na degustação às cegas promovida pelo "Comida".

Cafés amargos são geralmente submetidos a torras extrafortes, de grãos muito queimados que comprometem e mascaram o sabor.

É possível buscarmos, na história, a predileção por esse tipo de bebida. Auguste Escoffier (1846-1935), o francês considerado o pai da gastronomia moderna, começou sua carreira de cozinheiro no gosto incontido pelo café.

Proibido de tomar a bebida aos dez anos de idade, pois tinha "efeito estimulante" e era reservada aos momentos especiais da elite, virou seu objeto de desejo.

Foi de olho em sua avó que aprendeu o método de preparo e o repetiu -às escondidas- pouco depois. Pois seu primeiro gole foi uma tragédia: amargo, amargo.

Na França, a torra sempre foi, tradicionalmente, muito escura -o que destaca o amargor dos grãos na xícara.

Isso porque, com colônias como a África, que produz larga quantidade de cafés robusta (espécie que resulta em bebida de qualidade inferior), os grãos exigem uma torra mais intensa para que tenha suas características indesejáveis mascaradas, explica Nathan Herszkowicz, diretor da Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café).

No Brasil, também surgiu o hábito de tomar café muito torrado. Aqui, a matéria-prima sempre careceu de qualidade -historicamente, a produção de café no país foi ditada pela quantidade e não pela qualidade do produto.

É recente o movimento de produtores em investir em suas lavouras e buscar melhores práticas de colheita, secagem e variedades de café para se obter um produto de qualidade superior.

Pois os grãos commodities, com porcentagem de defeitos (que interferem negativamente na bebida), eram (e ainda são) extratorrados aqui pelo mesmo motivo: uma forma de esconder os problemas dessa bebida, que poderiam torná-la "intragável". "Também colabora o fator econômico", diz Herszkowicz. "Quanto mais escura a torra, mais o café rende no preparo: menos pó é usado para fazer a mesma quantidade."

Fato é que o brasileiro tem tomado cada vez mais café e está cada vez mais disposto a pagar por um produto de melhor qualidade.

No mesmo cenário, se enxerga o crescimento ininterrupto da oferta de cafés gourmets nas gôndolas -em 2000 não havia nenhuma marca gourmet, hoje são 110, de acordo com a Abic.

Está nas mãos do consumidor se desprender das tradições, abrir os horizontes para novos cafés e assimilar práticas mais cuidadosas. O café deve ser moído somente antes do consumo e comprado fresco, "como tomate", diz a barista tricampeã brasileira, Silvia Magalhães. "Toda semana!"

Fonte: Folha Online

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