Colômbia de olho no forte consumo brasileiro de café
Em tempos de forte queda das cotações internacionais do café, por conta de grandes volumes produzidos e incertezas sobre a demanda em tradicionais mercados consumidores, o Brasil desponta como um dos países emergentes onde as vendas do produto continuam a crescer e deverão seguir em expansão nos próximos anos. Alento para os produtores do país, a tendência não passou despercebida na Colômbia, que vislumbra abrir por aqui uma nova frente de disputa para agitar uma velha rivalidade antes restrita às exportações.
O "embate" se dará no campo dos cafés especiais, de qualidade superior, que ainda representam apenas de 3% a 4% do consumo brasileiro do produto e pelos quais os colombianos são conhecidos – com a ajuda de décadas de campanhas de promoção reconhecidamente eficientes. E para apoiar sua estratégia e fomentar as vendas de seu café verde, os vizinhos planejam inclusive trazer ao mercado brasileiro sua rede de cafeterias Juan Valdez, que já marca presença em países como Estados Unidos, México e Espanha.
Andrés Valencia, gerente comercial da Fedecafé, a influente federação de cafeicultores da Colômbia, dona da marca Juan Valdez, afirmou ao Valor que o grupo tem planos para o Brasil, mas não deu detalhes sobre a investida em gestação e jogou o foco da expansão para outros mercados. Afirmou que Coreia do Sul e Kuwait, por exemplo, deverão contar em 2014 com as primeiras cafeterias da rede – que hoje tem 238 lojas em nove países, 170 delas na Colômbia.
De janeiro a setembro deste ano, a Procafecol – empresa da Fedecafé que abriga a marca Juan Valdez e tem como acionistas cerca de 20 mil cafeicultores – registrou receita operacional de US$ 56 milhões, 20% mais que no mesmo período de 2012. As lojas comercializam vários tipos de cafés, entre os quais orgânicos, "sustentáveis" e edições especiais. A Fedecafé representa, no total, cerca de 480 mil dos 570 mil produtores colombianos de café. A entidade também é responsável por repassar os subsídios concedidos pelo governo quando as cotações estão baixas.
Baixo é também o consumo interno de café na Colômbia, o que torna a descoberta de novos mercados quase uma obrigação. São cerca de 1,4 milhão de sacas de 60 quilos por ano, estima Valencia, ante uma produção que caminha para voltar a superar 10 milhões (ver matéria abaixo). No Brasil, segundo maior consumidor global do grão, atrás dos EUA, serão cerca de 21 milhões de sacas este ano, entre 2,5% e 3% mais que em 2012, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic).
Mas, mesmo econômico nos detalhes, Valencia afirmou que há negociações em curso para que o Brasil libere a importação de café verde da Colômbia. "Espero que o brasileiro possa ter acesso a um bom café colombiano". Seria, segundo ele, uma maneira de o Brasil "melhorar" seus blends de torrado e moído e ter um universo mais amplo de sabores. Para ele, o fato de a Colômbia ter importado 50 mil sacas de café do Brasil em 2012 pode ajudar nas negociações. "Queremos ter 10% do mercado brasileiro de cafés especiais, hoje estimado em 1 milhão de sacas".
Hoje, o Brasil não importa café cru (matéria-prima). A operação está condicionada a análises de risco de pragas do Ministério da Agricultura. Uma fonte do segmento disse que não há análises finalizadas sobre os produtos de nenhum país, embora acredite que o risco de entrada de pragas é pequeno. Já a importação pelo regime de drawback, com a eliminação de tributos para a compra de matéria-prima no exterior para posterior exportação de produto industrializado, é uma reivindicação antiga – sobretudo por parte da indústria de café solúvel, que perdeu competitividade por não ter matéria-prima (café robusta, de menor qualidade) suficiente para ampliar sua produção.
Por meio de sua assessoria de imprensa, o Ministério da Agricultura informou que há pedidos para análises de risco de pragas apresentados por alguns países interessados em exportar café verde ao Brasil, e elas estão em andamento.
Se o drawback de café é um assunto polêmico dentro do governo, a "internação" – importação do grão verde para consumo no país – sequer é "mencionada". Esse é o mecanismo que possibilitaria a compra de pequenos volumes de outros países para serem misturados aos grãos brasileiros em blends diferenciados. Mas essa ainda não é uma "bandeira" da indústria, que se ressente do aumento da importação de cafés especiais (industrializados) com blends que contêm diferentes origens de café.
A indústria brasileira não pode competir com esses produtos que utilizam essa diferenciação (grãos de vários países) como um diferencial de marketing, lembra Nathan Herszkowicz, diretor-executivo da Abic. Ele afirma que pesquisas mostram que o consumidor brasileiro gosta de experimentar e aprecia diferenciação. Para ele, o cobiçado mercado brasileiro de cafés especiais ainda é pequeno e uma eventual concorrência colombiana representaria uma ameaça à indústria nacional.
Atualmente, as empresas radicadas no país dominam o mercado brasileiro de cafés de melhor qualidade. No Programa de Qualidade do Café da Abic, existem 110 marcas de café gourmet (incluindo estrangeiras) certificadas e monitoradas.
Fonte: Valor Econômico