Café Sustentável

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O tema ainda assusta muitos produtores rurais, mas devagar, com jeitinho e sempre, os cafeicultores vão se conscientizando da importância de um processo de produção que atenda às normas de respeito ao meio ambiente e às relações mais humanas de trabalho. O Brasil orgulha-se hoje de um título precioso aos olhos do mercado mundial: somos o maior produtor do planeta em quantidade de café sustentável, mas o mercado quer mais e, no fundo no fundo, o produtor e o consumidor também. Afinal, nós merecemos. Claro.

Pedro Ronca é especialista em sustentabilidade e apresentou palestra em Varginha (MG). (Foto: Margarida Hallacoc / Revista Viés)
Pedro Ronca é especialista em sustentabilidade e apresentou palestra em Varginha (MG). (Foto: Margarida Hallacoc / Revista Viés)

O mundo exige café com boas práticas

Especialista em sustentabilidade, Pedro Ronca, que também é produtor na região de Jaruaia, Sul de Minas, tem corrido o Brasil afora anunciando a boa nova: o Brasil dá a largada em termos de café de qualidade e é também o maior produtor, mas tem um imenso dever de casa pela frente, se quiser continuar emparelhado a outros gigantes do mundo.

O assunto sustentabilidade já não é encarado pelo mundo como um item da moda, mas uma exigência de mercado. Uma obrigação técnica. “As portas do mundo estão abertas ao nosso café, que tem excelente qualidade, mas o comprador quer saber a origem, procedência do que está comprando. Ele exige”, avisa Pedro Ronca.

Hoje, com os recursos tecnológicos existentes, é relativamente fácil checar de onde vem um produto e em quais condições fora produzido. Bom para quem dá importância ao assunto, ruim para quem fica para trás. O café sai do Brasil carregando em seu DNA todas as nossas práticas de produção.

Em palestra realizada em Varginha, Pedro Ronca ressaltou que o país não está atrasado na questão, mas também não pode cochilar. De acordo com ele, as maiores torrefadoras do mundo brigam pela liderança do mercado, mas estão unidas quanto a um objetivo comum: produzir um café de qualidade e com sustentabilidade. O interesse é tanto que há grande investimento financeiro nessa empreitada.

O slogan, eles também já têm: “Visão 20 20” – em referência ao sentido de visão perfeita em inglês. A meta é chegar ao ano de 2020 enxergando a produção de café de todo o mundo com outro olhar. E eles têm pressa. A Colômbia, por exemplo, pegou carona rapidinho na mobilização mundial da tal “Visão 20 20” e criou um slogan para o marketing interno: “Visão 20 27”, que traduz o compromisso daquele país em chegar em 2027, quando a produção do café colombiano completa 100 anos, com todas as lavouras certificadas com selo de sustentabilidade. Desafio lançado, cabe ao Brasil, como um gigante de produção, pensar em uma saída. O tempo urge.

O recado dos países compradores do Primeiro Mundo é claro. Eles querem um café de boa qualidade e equilibrado em um tripé já difundido entre os produtores: um alimento seguro para consumo, em relação à qualidade, e obtido da produção responsável, do ponto de vista ambiental e social. Ou seja, países importadores só irão comprar grãos certificados, provenientes de lavouras preocupadas com a qualidade, que não depredam o meio ambiente nem exploram trabalhadores.

Derrapamos na largada

Plantar café muito próximo dos cursos d’água ou nascentes; deixar embalagens de adubo e produtos químicos espalhadas nas lavouras; usar mão de obra de menores ou trabalhadores mal instalados são atitudes que podem deixar o produtor fora do mercado. “É uma tendência sem volta. A preocupação com o meio ambiente é muito grande. O mundo todo sabe que o Brasil é um país rico em recursos naturais. Cobram de nós responsabilidade com a preservação da riqueza que temos. O mundo só quer café produzido com boas práticas”, diz Pedro Ronca, especialista em sustentabilidade.

As torrefadoras, segundo Ronca, estão atrás de cafés com certificação e, dentro de pouco tempo, só irão comprar produtos certificados. “A Nestlé, por exemplo, já anunciou que irá torrar neste ano algo entre 14 milhões de sacas de café. Deste volume, 3 milhões de sacas têm o selo 4C. Entre os anos de 2004 a 2014, já são sete selos de certificação no mundo aceitos pelas torrefadoras e todos em pleno crescimento”, observa.

No Brasil, 87% das lavouras de café estão nas mãos de pequenos produtores, exigindo verdadeiro trabalho de formiguinhas para conscientizar sobre a importância das boas práticas nas lavouras. Pedro Ronca alerta que o país começou errado nesta empreitada, ao incentivar os produtores a buscar o selo em troca de compensações de um mercado que pagasse melhor pelo café. “Claro que ganhar dinheiro com café certificado é a melhor parte, mas o produtor precisa entender que isso é uma consequência de todo um trabalho bem feito e não um único objetivo”, lembra. “Uma fazenda ou um pequeno sítio que adote as boas práticas sai no lucro de qualquer maneira, pois isso é decisivo para a melhoria geral do local e o ganho com um café cada vez melhor, vem como acréscimo”, defende o especialista em sustentabilidade.

Pequenos, médios e grandes produtores não estão sozinhos nessa busca, segundo ele. As cooperativas, por exemplo, têm papel importante nesse avanço, assim como todas as entidades e associações ligadas à cadeia do café. “A proposta é trabalharmos todos juntos para assegurarmos mais sustentabilidade ao café, maior lucro e principalmente mais qualidade de vida no campo. O produtor que produz de maneira efetivamente sustentável obtém maior lucro porque adota uma gestão eficiente. Com isso, economiza insumos, melhora a produtividade e a qualidade do produto, além do controle dos custos. O solo e a água são preservados e, portanto, este produtor, se torna o maior beneficiário”, observa.

O produtor José Cláudio Baldim, de Monsenhor Paulo, Sul de Minas, adotou as boas práticas em sua propriedade em busca da certificação. Ele conta que no começo enfrentou críticas até dos vizinhos. “Eles olhavam meio desconfiados, mas agora já chegam para me perguntar, assim como quem não quer nada, como eu consegui melhorar a minha lavoura que está mais bonita. Percebo que também já estão interessados”, conta.

Serviço

O Currículo de Sustentabilidade do Café (CSC) é um documento de elaboração coletiva, concluído, em março do ano passado, com a participação dos Serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural dos principais estados produtores de café do Brasil. O CSC foi baseado na Produção Integrada de Café (PI-Café). O CSC não é um sistema de certificação. É a seleção dos temas centrais e fundamentais para a atuação em sustentabilidade, tanto do produtor como do técnico. O conteúdo está dividido em três categorias de práticas: proibidas, prioritárias e recomendadas.

Fonte: Revista Viés (Margarida Hallacoc)

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