Avaliadores e degustadores ganham espaço nas fazendas de café

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Diante de um cenário cada vez mais concorrido e ao mesmo tempo promissor para os produtores de cafés especiais, as fazendas abrem espaço para um profissional capaz de promover o aumento de até 50% do valor agregado dos grãos. Trata-se do classificador e degustador de café com conhecimento e metodologia para avaliar o produto segundo critérios internacionais, o chamado Q-Grader (na sigla em inglês, q de qualidade).

Desde 2012, eles têm sido mais requisitados. Com salários que podem variar de R$ 3 mil a R$ 30 mil, esses “garimpeiros de tesouros” são certificados e se antes atuavam nas empresas e nas cooperativas, agora, com a expansão dos grãos diferenciados, tornam essenciais no campo.

O Q-Grader é, numa definição simplificada, um provador de café qualificado, que recebeu treinamento do instituto de qualidade de café Coffee Quality Institute (CQI na sigla em inglês) da Associação Americana de Cafés Especiais (SCAA). A prática da profissão vai muito além disso.

“Só para receber o certificado, a pessoa precisa passar por 26 provas, que abordam degustação de café verde e torrado, habilidades sensoriais, capacidade de identificar o ácido, o doce e o salgado. Há, também. prova escrita, degustações de cafés de seis regiões do mundo, como os da África, Indonésia, Brasil, América do Sul, ente outros”, explica Mário Reis, dono Café dos Reis e um Q-Grader desde 2013.

Reis conta que, há três anos, quando resolveu se tornar um Q-Grader, trabalhava no Sebrae e já tinha experiência em degustação de cafés. “Então, entrei nesse mercado e, além da profissão, tenho a minha empresa de torrefação, a Café dos Reis”, diz. Ele ressalta que as mulheres, por ter um olfato e paladar mais apurados, podem se dar bem nesse mercado. “É preciso muita prática”, avisa. Atualmente, no país, há poucos Q-Graders, o que garante espaço ainda a ser conquistado pela profissão.

Warley Carlos de Oliveira é um desses profissionais raros. Há 14 anos trabalhando com café, ele se tornou Q-Grader em 2013. “Trabalho na parte de classificação da bebida, dentro de cooperativas, mas fui acompanhando o crescimento dos grãos especiais e resolvi ter essa certificação internacional”, afirma. Ele comenta que se trata de profissão apaixonante, mas que requer experiência. Warley começou a atuar nas fazendas, onde esse profissional está sendo muito demandado.

BONS FRUTOS “Os produtores estão entendendo a necessidade de contratar um Q-Grader, porque muitas vezes o produtor vendia sacas de café sem saber que ali havia grãos especiais de alto valor”, diz. É o que reforça Tiago Alves, dono do Café Barinas, de Araxá, no Alto Paranaíba. Ele contratou Warley com a finalidade de melhorar a qualidade do café que produz.

Com a atuação do Q-Grader, a classificação do Barinas alcançou 87 pontos, uma nota alta no ramo cafeeiro. “É um trabalho de longo prazo e, principalmente, de consciência entre os outros trabalhadores da fazenda. O Warley nos acompanha em toda a produção e, com isso, as nossas vendas cresceram cerca de 20%”, revela.

Jorge Fernando Naimeg, produtor em Patos de Minas, também no Alto Paranaíba, contratou um Q-Grader para a sua produção. Com a novidade, registrou aumento de 50% das vendas. “É um garimpeiro, que seleciona o ouro nos cafés. Conseguimos aumentar o nosso valor agregado. É fundamental esse trabalhador”. Milton Ferreira, o Q-Grader que trabalha para Naimeg, diz que a profissão é prazerosa, mas só a experiência traz bons frutos. “Fiz muitos cursos para conseguir o certificado, um deles na Universidade Federal de Lavras (Ufla)”, conta.

Na semana passada, durante a Feira Internacional do Café, realizada em Belo Horizonte, o trabalho do profissional de degustação e classificação foi destaque nos debates. Houve muitas degustações de cafés com a participação desses profissionais. O evento abordou novidades e tendências de negócios do universo cafeeiro durante três dias no centro de convenções Expominas. Estiveram reunidos no local cerca de 15 mil visitantes e 165 marcas expositoras.

Capacitação como Q-Grader exige investimento alto

Torna-se um Q-Grader não é tarefa fácil, como pode parecer. O Brasil oferece poucas oportunidades  de formação voltada aos exames necessários para conquista do certificado profissional. Uma das referências no ramo profissional é a Universidade Federal de Lavras (Ufla), que, por causa da demanda crescente, fará no ano que vem um cronograma fixo voltado para a área. A universidade também deseja aplicar a avaliação para Q-Grader, para qual é necessário laboratório específico. De acordo com a instituição, 80% da estrutura exigida estão prontos. Em Belo Horizonte, a Academia do Café tem certificação para aplicar o teste.

Segundo Rosemary Gualberto Alvarenga Pereira, coordenadora do polo de qualidade do café da Ufla, antigamente esse profissional era raríssimo no país. “Com o crescimento dos cafés especiais, o que incentivou os produtores a melhorar a qualidade dos seus produtos, houve um interesse grande por esse trabalhador”, comenta. Ela diz que, por causa disso, a universidade oferece cursos de treinamento para quem quer o certificado internacional e também para os produtores do grão, de forma que eles se aprofundassem no assunto.
“O Q-Grader vai muito além de um degustador normal. Ele tem que reconhecer sabor, aroma, intensidade, reconhecer se a bebida é cítrica, exótica entre outras.” Rosemary é Q-Grader e diz não ser fácil a obtenção do título. “E há uma demanda grande para o treinamento, por isso, a Ufla faz as capacitações, tanto para quem já é um degustador quanto para quem está começando.” Ela revela que para ministrar os cursos, os professores concluíram doutorados em várias áreas do setor cafeeiro. Rosemary é doutora em colheita e pós-colheita.

“O salário desse profissional vai depender de onde ele atua. Em uma empresa, por exemplo, como gerente de qualidade, ele não ganha menos de R$ 4 mil”, diz. Aquele que ganha cerca de R$ 30 mil, segundo ela, é o Q-Grader voltado para a exportação e conhecedor do mercado internacional.

“Quando trabalha no campo, acompanha tudo. E atua como um gestor de qualidade, visando a sustentabilidade da fazenda. Não adianta conseguir uma pontuação de 80 pontos em um ano e não conseguir no outro. Por isso, é uma atuação constante.”

Para um curso voltado à obtenção da certificação internacional, são necessários cafés internacionais de alto valor. Por isso, é cobrado um preço mais “salgado” do aluno. “Há três anos, um curso que fiz custou R$ 4,5 mil”, exemplifica Rosemary.

As instituições habilitadas na aplicação do exame internacional dispõem de um laboratório com várias especificidades, como luminosidade, filtro de água, entre outros. “O credenciamento para que a Ufla possa aplicar a prova é a nossa meta de 2017”, afirma.

Fonte: Estado de Minas (Por Luciane Evans) (Com foto divulgação da SIC)

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