A cafeicultura familiar brasileira no contexto do Ano Internacional da Agricultura Familiar

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A Organização das Nações Unidas – ONU declarou 2014 como o Ano Internacional da Agricultura Familiar – AIAF. A agricultura familiar inclui todas as atividades agrícolas de base familiar e está ligada a diversas áreas do desenvolvimento rural, inclusive à cafeicultura. Além de estar intimamente vinculada à segurança alimentar, esse tipo de agricultura preserva os alimentos tradicionais, contribui para alimentação balanceada, para a proteção da agrobiodiversidade e para o uso sustentável dos recursos naturais.

 

De acordo com a FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), o AIAF visa aumentar a visibilidade da agricultura familiar e dos pequenos agricultores, focalizando a atenção mundial na importante missão de erradicação da fome e pobreza, provisão de segurança alimentar e nutricional, melhora dos meios de subsistência, gestão dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e para o desenvolvimento sustentável, particularmente de áreas rurais. A proposta do AIAF, segundo a ONU, é promover ampla discussão e cooperação mundial para aumentar a conscientização e entendimento dos desafios que os pequenos agricultores enfrentam. O AIAF também pretende ajudar a identificar maneiras eficientes de apoiar a agricultura familiar.

Segundo o Censo Agropecuário de 2006, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, 81% dos estabelecimentos produtores de café são de agricultura familiar. A cafeicultura familiar emprega em torno de 1,8 milhão de pessoas por ano e é responsável por 38% do café produzido no Brasil. De acordo com o IBGE, a área colhida por cafeicultores familiares corresponde a 44% da área colhida de café no Brasil.

Consórcio Pesquisa Café – Criado em 1997, ao longo dos seus 17 anos de trabalho, no desenvolvimento dos seus projetos vem privilegiando a cafeicultura familiar no Brasil. Segundo o Informe Estatístico do Café – Departamento do Café/Mapa, a área de produção e a produtividade do café, em 1997, era de 2,4 milhões de hectares com produtividade de 8,0 sacas/hectare e produção total de 18,9 milhões de sacas de 60kg. Em 2013, conforme a Conab (dez/2013), com praticamente a mesma área de produção – 2,3 milhões de hectares – o País produziu 49,1 milhões de sacas, com uma produtividade de 24,38 sacas/ha.

O Consórcio congrega instituições de pesquisa, ensino e extensão localizadas nas principais regiões produtoras do País. Seu modelo de gestão incentiva a interação das instituições e a otimização de recursos humanos, físicos, financeiros e materiais. Foi criado por dez instituições: Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola – EBDA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa, Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais – Epamig, Instituto Agronômico – IAC, Instituto Agronômico do Paraná – Iapar, Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural – Incaper, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – Mapa, Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro – Pesagro-Rio, Universidade Federal de Lavras – Ufla e Universidade Federal de Viçosa – UFV.

Contribuições do Consórcio para a cafeicultura familiar – Para o professor Juarez Sousa e Silva, que desenvolve pesquisas na Universidade Federal de Viçosa – UFV, integrante do Consórcio, os pequenos cafeicultores, com exceção dos organizados no sistema de cooperativas, têm poucas possibilidades de comercializar a produção diretamente com os mercados consumidores, ou de retê-la, aguardando melhores preços. Esses cafeicultores, explica Juarez, por não produzirem café com agregação de valor, vendem o produto a atravessadores que pagam o preço que melhor lhes convém. “Entretanto, pesquisadores do Consórcio desenvolvem e transferem tecnologias em pós-colheita, entre outras de interesse da lavoura cafeeira, apropriadas à cafeicultura de base familiar. Simultaneamente, vêm produzindo e disponibilizando material bibliográfico, em linguagem simples, para a construção e utilização das tecnologias com eficiência comprovada”, acrescenta Juarez.

Conheça algumas cultivares desenvolvidas pelo Consórcio com potencial de uso pela cafeicultura familiar:

BRS Ouro Preto – Recomendada especialmente para Rondônia – segundo produtor de café conilon do Brasil – a cultivar foi obtida pela seleção de cafeeiros com características adequadas às lavouras comerciais do estado e adaptada ao clima e ao solo local, com tolerância aos principais estresses climáticos da região: alta temperatura, elevada umidade do ar e déficit hídrico moderado. A BRS Ouro Preto tem potencial para aumentar a produtividade da cafeicultura em Rondônia e poderá ter sua recomendação estendida para outras regiões da Amazônia. A produtividade média do café em Rondônia é de 11 sacas/ha; já a da Conilon BRS Ouro Preto é de 70 sacas/ha.

Centenária Incaper 8132 – Desenvolvida pelo Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural – Incaper, a cultivar é formada pelo agrupamento de nove clones compatíveis de maturação tardia, com colheita concentrada no mês de julho. A produtividade, considerada alta, é de 82,36 sacas beneficiadas por hectare. Seu maior destaque é a qualidade superior da bebida que apresentou, em testes sensoriais, características de sabor e aroma que remetem ao achocolatado, caramelo e frutado.

Jequitibá Incaper 8122 – Desenvolvida pelo Incaper, a cultivar é formada pelo agrupamento de nove clones compatíveis de maturação intermediária, com colheita concentrada no mês de junho. Destaca-se pela elevada produtividade, de 88,75 sacas beneficiadas por hectare, e pela qualidade superior da bebida. Em análises sensoriais, a bebida apresentou características de sabor adocicado e aroma que remete ao chocolate amargo e a caramelo com chocolate.

Diamante Incaper 8112 – Desenvolvida pelo Incaper, a cultivar é formada pelo agrupamento de nove clones compatíveis de maturação precoce, com colheita concentrada no mês de maio. A produtividade, considerada alta, é de 80,73 sacas beneficiadas por hectare. O maior destaque da cultivar é a qualidade superior da bebida que apresentou, em testes sensoriais, características de sabor e aroma que remetem ao cacau e ao chocolate. Apresentou, ainda, toque de frutas vermelhas e retrogosto adocicado.

IPR 100 – Desenvolvida pelo Instituto Agronômico do Paraná – Iapar, a IPR 100 foi a primeira cultivar de café arábica resistente ao nematoide M. paranaensis sem a necessidade de enxertia. Desenvolvida a partir do melhoramento genético tradicional, a nova variedade faz parte dos esforços da instituição em buscar alternativas de controle do parasita sem a necessidade de aplicação de agroquímicos, que encarecem o custo para o agricultor e ainda podem contaminar o solo e até o lençol freático porque os nematoides vivam nas raízes das plantas. A cultivar é indicada preferentemente para regiões quentes, com temperatura média anual acima de 21,5°C – e principalmente para a região Noroeste do Estado do Paraná, onde a presença do nematoide é mais frequente. Gera bebida de boa qualidade, encorpada, levemente ácida e de sabor doce.

Tupi RN IAC 1669-22 – Desenvolvida pelo Instituto Agronômico – IAC, a cultivar apresenta elevada produtividade, boas características agronômicas e tecnológicas e precocidade em relação às cultivares comumente utilizadas. Resistente à ferrugem e ao nematóide Meloidogyne exigua, requer menor utilização de agroquímicos, gerando considerável economia e sensível redução dos riscos relacionados à poluição ambiental e à saúde dos agricultores e consumidores. Em plantios irrigados, a cultivar produziu 91, 50 e 89 sacas beneficiadas por hectare nos três primeiros anos, respectivamente, em espaçamento de 3,6×0,5m.

IPR 103 – Desenvolvida pelo Iapar, a cultivar apresenta moderada resistência à ferrugem-do-cafeeiro, resistência parcial à necrose dos frutos e sistema radicular rústico. Possui alto vigor e produtividade. Gera bebida de qualidade boa e é adaptada ao calor e a solos pobres.

Araponga MG 1 – Desenvolvida pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais – Epamig e pela Universidade Federal de Viçosa – UFV, a cultivar possui alto vigor vegetativo, boa arquitetura das plantas, alta produtividade e resistência à ferrugem, proporcionando redução no custo de produção e menor impacto ao meio ambiente por permitir menor utilização de defensivos agrícolas no manejo da cultura. A qualidade da bebida é idêntica à das cultivares comerciais Catuaí e Mundo Novo, de acordo com testes realizados durante o processo de seleção da cultivar.

Topázio MG 1190 – Desenvolvida pela Epamig e Universidade Federal de Lavras – Ufla, a cultivar proporciona excelente produtividade e elevado vigor vegetativo, não exibindo depauperamento precoce depois de elevadas produções. Os frutos são de coloração amarela e as folhas, quando novas, são predominantemente de cor bronze-escuro. Gera bebida de boa qualidade.

Paraíso MG H 419-1 – Desenvolvida pela UFV, a cultivar é indicada para as regiões cafeeiras do Estado de Minas Gerais aptas para o cultivo da espécie Coffea arábica. Apresenta alto nível de resistência ao agente causador da ferrugem-do-cafeeiro e representa uma opção para a produção de café orgânico, em razão de ser resistente à ferrugem-alaranjada-do-cafeeiro, que é a principal doença da cultura. Seu porte baixo facilita a colheita e mecânica dos cafeeiros, além de possibilitar maior densidade de plantio.

Oeiras MG 6851 – Resultado do esforço conjunto entre a UFV e a Epamig, a maioria dos cafeeiros dessa cultivar são resistentes às raças de Hemileia vastatrix Berk et Br., prevalecentes nas regiões cafeeiras do Estado de Minas Gerais. No entanto, já se observa, em alguns locais, a ocorrência de plantas com moderada incidência de ferrugem. É preferencialmente indicada para as regiões de elevada altitude do Triângulo Mineiro, alto Paranaíba, Sul de Minas e Zona da Mata de Minas. Em razão de sua resistência à ferrugem-do-cafeeiro e de seu porte e arquitetura, pode ser utilizada em plantios adensados em espaçamentos de 2,0 a 2,5m entre fileiras e de 0,50 a 0,70m entre plantas dentro das fileiras.

Catiguá MG 1, MG 2 – Desenvolvida pela Epamig e UFV, as cultivares são resistentes às raças prevalecentes do fungo causador da ferrugem-do-cafeeiro. As folhas novas da Catiguá MG1 apresentam cor bronze. Já as da Catiguá MG2 apresentam coloração bronze e verde. Devido às folhas ligeiramente lanceoladas e posicionadas em ângulo agudo em relação ao ramo, sugerindo um formato de espinha de peixe, tais cultivares são facilmente identificadas. Seus frutos, quando bem maduros, são de coloração vermelha intensa. A altura das plantas, o diâmetro médio da copa e a produtividade são semelhantes aos das cultivares Catuaí Vermelho IAC 144 e IAC 15. A catiguá MG2 apresenta bebida de excelente qualidade.

Mais tecnologias para a cafeicultura familiar – Várias são as tecnologias desenvolvidas no âmbito do Consórcio e aplicáveis à pequena propriedade e à cafeicultura familiar, entre elas: além das cultivares, pode-se citar o cultivo de café adensado; manejo de plantas daninhas usando leguminosas herbáceas consorciadas com café; tecnologias para pós-colheita como a abanadora manual para fazer a limpeza do café durante colheita; lavador portátil; Sistema para Limpeza de Águas Residuárias – SLAR; rodo enleirador para café; silo-secador; fornalha a carvão vegetal; terreiro secador híbrido e secador solar.

Conheça também outras tecnologias de pós-colheita com potencial de uso pela cafeicultura familiar divulgadas em publicações técnico-científicas disponíveis no site da Embrapa Café nos links abaixo:

Infraestrutura mínima para produção de café com qualidade – opção para a cafeicultura familiar http://www.sapc.embrapa.br/index.php/view-details/diversos/949-infraestrutura-minima-para-producao-de-cafe-com-qualidade-opcao-para-a-cafeicultura-familiar

Fornalha a carvão para secagem de café e grãos http://www.sapc.embrapa.br/index.php/view-details/circular-tecnica/939-circular-tecnica-2-fornalha-a-carvao-para-secagem-de-cafe-e-graos

Lavadores e sistema de reuso da água no preparo do café http://www.sapc.embrapa.br/index.php/view-details/circular-tecnica/948-circular-tecnica-4-lavadores-e-sistema-de-reuso-da-agua-no-preparo-do-cafe

Construção e utilização do terreiro híbrido para a secagem do café http://www.sapc.embrapa.br/index.php/view-details/comunicado-tecnico/recomendacoes-tecnicas/942-comunicado-tecnico-3-construcao-e-utilizacao-do-terreiro-hibrido-para-a-secagem-do-cafe

Construção de ventiladores centrífugos para uso agrícola http://www.sapc.embrapa.br/index.php/view-details/comunicado-tecnico/recomendacoes-tecnicas/943-comunicado-tecnico-3-construcao-de-ventiladores-centrifugos-para-uso-agricola

Produção de café cereja descascado – equipamentos e custo de processamento http://www.sapc.embrapa.br/index.php/view-details/comunicado-tecnico/recomendacoes-tecnicas/946-comunicado-tecnico-4-producao-de-cafe-cereja-descascado-equipamentos-e-custo-de-processamento

 

Para saber mais sobre a Embrapa Café, o Consórcio Pesquisa Café e o Ano Internacional da Agricultura Familiar, acesse:

http://www.consorciopesquisacafe.com.br//a>

http://www.sapc.embrapa.br/

http://www.fao.org/family-farming-2014/pt/

Fonte: Gerência de Transferência de Tecnologia (Texto: Carolina Costa – MTb 7433/DF e Flávia Bessa – MTb 4469/DF)

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